Do Canadá vieram três nomes dos que mais apreciei, e aprecio, desde a explosão da música popular nos anos 60 e que rapidamente me cativaram. Nesta "Passagem por 20 álbuns ímpares da década de 70" já passei dois deles, Neil Young e Joni Mitchell, faltava o inevitável Leonard Cohen.
Leonard Cohen (1934-2016), poeta de raiz, emprestou os seus poemas e a sua voz sussurrada a lindíssimas melodias que concebeu e arquitectou desde o seu primordial "Songs of Leonard Cohen" (1967) até ao seu testamentário "You Want It Darker" (2016). Mais de 50 anos na música e 14 álbuns de originais são o legado musical que Leonard Cohen nos deixou para nosso contentamento e para todo o sempre.
Não foi o seu disco mais popular, esse viria mais tarde com "Im Your Man" (1988), mas é aquele que mais horas de fruição me deu, falo de "Songs of Love and Hate" (1971), um álbum singular de um ano altamente produtivo. Os arranjos sumptuosos de Paul Buckmaster deram uma intensidade e dramatismo que levou o próprio Leonard Cohen e secundarizá-lo, mas para mim vieram somente intensificar e evidenciar a grandeza das suas composições de "amor e ódio".
Edição portuguesa de 1971 com a referência S 69004 |
O álbum termina com a conhecida e belíssima canção "Joan of Arc" com os seus longos 6 minutos e meio.
No livro "Leonard Cohen - Redescoberta da Vida e uma Alegoria a Eros" de Manuel Cadafaz de Matos, na entrevista por este feita a Leonard Cohen, em Paris, a 8 de Setembro de 1974 à pergunta "... Tu tens mostrado há já longa data um certo favoritismo por essa figura nacional francesa [Joana d'Arc]. Onde talvez conseguiste atingir uma maior craveira poética dessa mulher foi na última canção do álbum «Songs Of Love And Hate» no tema com o seu nome. É uma das tuas composições que eu considero como uma de maior profundidade talvez até a nível metafísico. Esse tema não terá para ti fundamentos psicanalíticos ou então de tendências psicológicas? Que representa esse tema para ti?
respondeu Leonard Cohen:
"É muito difícil falar sobre isso porque eu apenas compreendo que Joana d'Arc está no poema. Não consigo bem explicar porque todos os meus sentimentos e emoções estão destilados no poema que é um «todo» que eu sinto e não consigo dissecá-lo. Sinto o poema mas não o posso explicar".
E a entrevista continuava assim:
"-Tu principiaste a interessar-te pelo tema Joana d'Arc a partir de um determinado momento histórico, não é verdade? Foi a sua lenda que te influenciou? A sua vida e a sua obra e o que ela representou para o povo francês numa época determinada?
- Historicamente eu conheci Joana d'Arc pela sua lenda. Mas hoje, nos nossos dias, eu sinto que ela está viva, pois (ainda) representa certas relações existentes entre os homens e as mulheres. É uma personagem actual muito grande, muito importante, muito viva, numa paisagem secreta, vivendo em todos os corações. Em França, no Quebeque e até mesmo nos Estados Unidos ela existe como qualquer qualquer coisa muito difícil de definir. Para mim eu sei-o, apenas talvez não o consiga neste momento dizer aos outros. O que eu sei é que a personagem de Joana d'Arc tocou em mim e atraíu-me.
- Por exemplo quando tu afirmas no teu poema-canção «Joana d'Arc»: «If he was fire, oh then she must be wood», «Se ele era fogo, oh então ela (Joana) devia ser lenha (para ser ardida)», não será que tu consideras que uma mulher normal - que vieram a rotular de santa - tem necessidade de ser satisfeita nas suas mais elementares necessidades biológicas como é o caso da satisfação sexual?
- Sim e não, porque eu acho que o poema tem a sua vida própria. Temos de analisar um todo e não só um elemento. Passei dois anos a escrever esta canção, mudando com frequência as suas formas musicais e poéticas. Lembro-me bem da manhã em que comecei a escrever esta canção. Estava num quarto do Hotel Chelsea em Nova Iorque."
Depois confessa que começou a escrever o poema depois de ter "...tido relações sexuais. Mas já não me lembro do nome dela pois isto passou-se num daqueles dias em que eu tomava ácido e me drogava."
Referindo-se a esta canção a wikipédia afirma: "This song was apparently inspired by Cohen's love for the German model Nico" pelo que fica agora a dúvida, inspirado em Nico, que cativou o mundo artístico underground dos anos 60, ou simplesmente fruto de uma relação ocasional e sob efeitos de droga?
Com a letra e respectiva tradução, que também faz parte do mesmo livro, e sem mais delongas segue para audição "Joan of Arc".
Leonard Cohen - Joan of Arc
Mais uma grande escolha - e seria uma falta grave não o incluir, porque é fabuloso... Também tenho o livro do Cadafaz de Matos. Interessante, mas a tradução das letras é um pouco deficiente.
ResponderEliminarQuanto ao álbum, foram inúmeras as audições e não descansei enquanto não aprendi a tocar Joan of Arc e Famous Blue Raincoat...
Sem dúvida, este álbum tinha que estar incluído. O problema é que depois de ter já escolhidos os 20 álbuns, lembro-me de outros que também deviam estar. Paciência, são as escolhas do momento.
ResponderEliminarBem, é que só 20 álbuns para uma década luminosa é mesmo muito pouco.... mas as escolhas têm sido absolutamente certeiras. Tapestry, Ziggy, Foxtrot.... excelente!
ResponderEliminarAbraço
Tem toda a razão, 20 álbuns é muito limitador para uma década tão importante. Espero, no entanto, que continue a gostar das opções que tomei.
ResponderEliminarAbraço