sábado, 13 de maio de 2017

Fernando Lopes Graça - O Milho da Nossa Terra

Textos sobre música na revista "Vértice"





Maio de 1947, nº 46 da revista "Vértice", é o 5º aniversário da revista e nele consta um interessantíssimo artigo de Fernando Lopes Graça intitulado: "SOBRE O CONCEITO DE POPULAR NA MÚSICA".
É o texto de uma "Palestra feita em Évora, na Escola do Grupo de Amadores de Música Eborense, por ocasião do seu 5.° aniversário." pelo compositor Fernando Lopes Graça.




Deste longo texto retiro alguns parágrafos que me parecem particularmente interessantes que diz respeito à ideia de "cultura popular".

"Já agora, deixem-me que novamente toque num assunto a que várias vezes tenho tido ocasião de me referir: a definição do que deve entender-se por «popular», tanto no campo da arte como no da cultura. Para muita gente, «popular» é sinónimo de fácil, de imediatamente acessível, de trivial, se é que não de superficial e inferior."
...
"Creio que nunca será demais denunciar este falso conceito do «popular», que não é, nunca foi, o que uma concepção aristocrática da cultura supõe ou adrede inculca. Não: popular não é o mesmo que ordinário e vulgarucho. Quem assim pensa ofende o povo nas suas capacidades de criação e compreensão, que as tem, e grandes, nas suas reservas de emoção, que também as tem e muitas vezes mais profundas do que se julga, na sua sede de cultura, na contribuição que a sua atormentada história tem dado às grandes obras do pensamento e da arte."
...
"A qualidade de popular advém-lhes das raízes profundas da sua inspiração, das aspirações largamente humanas que encarnam, das necessidades colectivas que satisfazem, do significado universal que possuem."








E contrapunha a música popular à música "revisteira" e "comercial":
"Do que acima fica dito se conclui que de maneira nenhuma podemos assimilar música popular à ladina copla revisteira ou à langorosa canção cinematográfica, aos viras mascarados de rumba ou às «sex-apealescas» cançonetas importadas da América e garganteadas pelas nossas «sex-apealescas» vedetas da rádio. Esta espécie de música nada tem que ver com o autêntico povo, não nasce do seu seio, não corresponde às suas necessidades, não traz a sua dedada. Trata-se, antes, de puros produtos comercialistas, destinados a um público de gosto pervertido, de nulo instinto estético e a quem a música só desperta sensações superficiais, de ordem puramente animal e vegetativa."
...
"Infelizmente, o comercialismo também já chamou a si mais esta fonte de receita. A música popular folclórica está-se tornando uma mina para os fabricantes de música dançante e desopilante. As belas e simples melodias que o povo canta de alma lavada, por esses campos e aldeias, nos seus trabalhos ou nas suas festas, estão sendo desvirtuadas, torcidas e inferiorizadas nos inúmeros foxes, rumbas, cançonetas e «arranjos» mais ou menos disparatados ou pretenciosos que fornecem o reportório das orquestras de jazz e os programas dos saraus recreativos radiofónicos. Preciso advertir-vos que não sou adversário irredutível e birrento da chamada música ligeira. Dentro do seu campo, pode esta exercer funções necessárias. Mas o que estou longe é de confundir «música ligeira» com «música popular»."




E já no final apelava:
"E também gostaria de vos aconselhar outra coisa: é que deligenciásseis aumentar sempre o vosso nível artístico, procurando, na medida possível e de acôrdo com os vossos recursos, aproximar-vos da boa arte, cultivando a vossa sensibilidade no contacto dos melhores autores e da melhor música, fugindo da banalidade e empenhando-vos em atingir aquele grau de cultura que, nem por se vos afigurar distante e de penosa consecução, constitui menos a meta ideal para que deverão tender as vossas vontades."

"O Milho da Nossa Terra", canção da Beira-Baixa, é uma das muitas canções populares que Fernando Lopes Graça gravou. Fazia parte do disco "Canções regionais portuguesas" editado em 1970.




Fernando Lopes Graça - O Milho da Nossa Terra

Sem comentários:

Enviar um comentário