Quem pelo ano de 1971 passou sabe que o ano foi fértil no crescimento do Rock
Progressivo. O Rock perdia a sua simplicidade inicial e aventurava-se por
territórios que lhe conferia uma complexidade acrescida. Um dos grupos que
mais se notabilizou foi Emerson, Lake and Palmer (Keith Emerson, ex-The Nice,
Greg Lake, ex-King Crimson e Carl Palmer, ex-Atomic Rooster).
No ano anterior tinham editado o aclamado álbum homónimo inicial, para mim o
melhor que fizeram, e a expectativa era grande quanto ao sucessor que ocorreu
no ano em apreço. "Tarkus" assim se designou, segundo o tema principal de mais
de 20 minutos que ocupava todo o lado A do disco e que já recordei no tema "O Rock Progressivo nos anos 70". O lado B era uma miscelânea de composições de
diferentes estilos que não me cativou.
Para o jornal "a memória do elefante" "Tarkus" foi o 8º melhor álbum do ano
considerando que
"Emerson Lake and Palmer têm aqui a sua via amadurecida se bem que nos
pareça que muito mais está ao seu alcance.". Na realidade, para meu gosto os Emerson, Lake and Palmer estavam prestes a
esgotarem-se e, a partir de 1972 deixei de os seguir.
Publicava o jornal "a memória do elefante" no seu nº 7 já em Fevereiro de 1972
as escolhas do jornal dos melhores álbuns e temas do ano de 1971 e verifica-se
o desfilar de grandes música que aquele ano ainda nos deixou. Para hoje o 9º
lugar na lista de álbuns, cuja escolha recaiu sobre Stephen Stills e o seu
álbum de estreia a solo "Stephen Stills I". Também na lista dos temas figurava
em 13º lugar com o tema "Church" o qual já recordei.
Apesar de ser o seu primeiro trabalho a solo, Stephen Stills era já uma figura
bem conhecida e reconhecida. Primeiro como elemento fundador dos excelentes
Buffalo Springfield cuja curta duração (1966-1968) não impediu a gravação de
dois álbuns bem recomendáveis. Entretanto (1968), um álbum de colaboração com
Mike Bloomfield e Al Kooper designado "Super Sessions". Depois foram os
históricos "Crosby, Stills & Nash" (1969) e "Déjà Vu" (1970) este já com Neil Young.
Pena que depois deste "Stephen
Stills I" a sua carreira tenha indo perdendo fôlego sem atingir o brilhantismo
de Neil Young, por exemplo.
"Resultado duma imaginação que ainda não se prostituira, o primeiro
Trabalho de Stephen Stills é uma obra das melhores do anos 71", afirmava-se no "a memória do elefante".
O final dos anos 60, início da década de 70 foi fértil no
desenvolvimento de diversas matizes musicais centradas no Rock. O Folk-Rock
foi uma delas e teve notoriedade maior quer no Reino Unido, com grupos como
Fairport Convention, Steeleye Span, Pentangle, Trees, quer nos Estados Unidos
onde os Crosby, Stills, Nash e Joni Mitchell terão sido das melhores propostas.
Outras ramificações se verificaram próximas do Folk-Rock com laivos de Country
e Blues e é aqui que encontramos os Seatrain de curta duração (1969-1973).
Publicaram 4 álbuns mas é o 2º e 3º, que tiveram a produção de George Martin, os
que proporcionam melhor prazer auditivo.
Para o jornal "a memória do elefante" os referidos dois álbuns, "Seatrain" e
"Marblehead Messenger" mereceram respectivamente o 17º e 26º lugar entre os
melhores do ano, enquanto que a canção "Song of Job" destacava-se no 9º lugar
dos melhores temas do ano de 1971.
"... SONG OF JOB onde o virtuosismo musical e a sobriedade necessária
se fundem num equilíbrio estético de rara beleza.", afirmava-se no texto.
Sem dúvida uma boa recordação de tempos de em que éramos surpreendidos quase
todos os dias por novas propostas musicais. Será que agora também é assim e eu
é que não estou suficientemente atento?
Do 10º melhor tema de 1971 para o 10º melhor álbum do mesmo ano. Estou a
seguir as escolhas do jornal "a memória do elefante" publicadas no seu nº 7. E
o 10º melhor álbum vai para: "Mary" de Mary Travers.
Mary Travers (1936-2009) ficou mais conhecida por ser a voz feminina do trio
Peter, Paul and Mary que nos deixou, nos anos 60, uma obra muito rica na área
do Folk norte-americano.
Depois da separação do trio em 1970, e antes de se reagruparem novamente em
1978, isoladamente efectuaram uma série de gravações das quais se destacam os
respectivos primeiros álbuns. O de Mary Travers designado somente "Mary"
mereceu a escolha do jornal "a memória do elefante" que o elegeu como o 10º
melhor de 1971. No pequeno texto referente a este álbum que reproduzo de
seguida, lê-se:
"MARY é música popular de elite e essencialmente um exercício de bom
gosto,"
Deste álbum é também escolhida uma canção que na lista dos melhores temas fica
em 8º lugar, é a maravilhosa "Children One and All".
Eis o texto publicado sobre esta canção.
"Prova dum sentido grande de beleza e de honestidade, CHILDREN ONE AND ALL
é a imagem duma América irremediavelmente dividida e um bom momento de
música popular."
Retomo hoje a passagem pelo nº 7, Janeiro/Fevereiro de 1972, do jornal "a memória do elefante" onde se fazia a selecção do melhor que o ano de 1971
tinha deixado, concretamente 27 temas e 27 álbuns eram escolhidos.
Entro agora nos 10 primeiros lugares e vou à tabela de temas buscar a 10ª
canção, era "The Man He Was" de Emitt Rhodes.
Depois Emitt Rhodes teve uma curta carreira a solo do qual só me lembro bem do
primeiro trabalho "The American Dream". É deste álbum a canção acima referida,
"The Man He Was".
Como habitual para terminar estas memórias de 2023 eis alguma da música feita
em Portugal e que passou pelos meus ouvidos. Tenho de reconhecer que pelo que
vou apercebendo muitos mais álbuns devia ter ouvido no ano passado, mas não há
tempo para tudo e tive que fazer as minhas opções, portanto entre o que ouvi
relevo os seguintes:
- Carminho - Portuguesa - Glockenwise - Gótico Português - Tó Trips -
Popular Jaguar - Margarida Campelo - Supermarket Joy - Maro -
Hortelâ -
Jorge Palma
- Vida -
Salvador Sobral
- Timbre - António Zambujo - Cidade - Expresso Transatlântico -
Ressaca Bailada
- Slow J - Afro Fado
A música popular portuguesa está entregue a uma nova geração de cantores,
compositores, muitos dos quais quase desconhecidos para mim. Da velha
geração de notar a resistência de Jorge Palma, actualmente com 73 anos, e
que nos prendou com mais um trabalho, "Vida", a merecer lugar entre o que de
melhor se fez entre nós em 2023.
https://mag.sapo.pt/
Agora, a minha escolha para hoje vai para o primeiro álbum dos promissores
Expresso Transatlântico, trio lisboeta que já nos tinha dado a conhecer um
muito interessante EP em 2021, de nome "Ressaca Bailada", ou os novos
caminhos da nossa música popular.
Sempre nutri um gosto especial pela música oriunda da Irlanda, de Van Morrison
a The Chieftains, e 2023 foi um ano particularmente bom. Refiro 5 discos que
sobressaíram:
- John Francis Flynn - Look Over The Wall See The Sky
- ØXN - CYRM
- Lisa O’Neill - All of This Is Chance
- Soda Blonde - Dream Big
- Lankum - False Lankum
Edição em CD da Rough Trade com a ref: RT0392CD
E a escolha vai para "False Lankum" do grupo Lankum. Demonstração da
vitalidade do Folk irlandês aqui apresentado de uma forma menos convencional,
onde o tradicional se mistura com sonoridades vanguardistas e inovadoras. É o
novo Folk, um Folk bem progressista a seguir com toda a atenção.
Hoje é dia de identificar uma lista de discos editados em 2023 e que de alguma
forma foram objecto da minha atenção com a respectiva audição mais ou menos
completa conforme a empatia que me proporcionaram. Sem qualquer ordem em
especial eis os álbuns de 2023 que de alguma maneira me parecerem meritórios
de pelo menos uma audição, o que já não é pouco nos tempos que correm.
- Unthank: Smith - Nowhere and Everywhere - Belle and Sebastian - Late
Developers - Lisa O'Neill - All Of This Is Chance - Fever Ray -
Radical Romantics - Elvis Costello, Burt Bacharach - The Songs Of
Barcharach & Costello - PJ Harvey - I Inside The Old Year Dying -
Nick Cave, Warren Ellis - Australian Carnage - Live at the Sydney Opera House -
Lankum - False Lankum - Cat Power - Cat Power Sings Dylan: The 1966 Royal
Albert Hall Concert - Julie Byrne - The Greater Wings - Boygenius -
The Record - Jaimie Branch - Fly or Die Fly or Die Fly or Die
(World War) - Sufjan Stevens - Javelin - Devendra Banhart - Flying
Wig - Slowdive - Everything Is Alive - Mitski - The Land Is
Inhospitable and So Are We - Anohni and the Johnsons - My Back Was A Bridge
For You To Cross - John Francis Flynn - Look Over The Wall See The Sky
- ØXN - CYRM
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Depois de 4 excelentes álbuns publicados entre 2000 e 2010 sob o nome de
Antony and the Johnsons, um interregno de 13 anos para voltar como Anohni and
the Johnsons para mais um meritório trabalho.
No entretanto ficou a mudança de nome de Antony para Anohni e um álbum a solo
sob este nome, "Hopelessness" (2016), com uma aproximação à electrónica que
não me agradou.
"My Back Was A Bridge For You To Cross" é o regresso ao Pop elegante e
sofisticado a que nos tinha habituado e dele destaco "Scapegoat", uma das
melhores, senão a melhor canção de 2023.
Não é dos sobreviventes doa anos 60, mas também não se encontra entre as
revelações do ano de 2023. Não encantou, mas também não desiludiu. Continua,
no entanto, a ser das propostas mais seguras da música popular actual ao
percorrer caminhos de não fácil exploração e não fáceis de catalogar. Trata-se
de PJ Harvey.
PJ Harvey encontra-se na casa dos 50 e ao fim de mais de 3 décadas de
actividade continua a ser uma proposta segura que o ano de 2023 viu regressar
ao fim de 7 anos sem novidades discográficas.
"I Inside the Old Year Dying" é menos acessível que os seu anteriores e não
logrou figurar nos lugares cimeiros, entre as diversas classificações
existentes, dos melhores álbuns do ano. É, no entanto, preciso dar tempo, e
infelizmente hoje em dia há pouco, não tendo a adesão imediata de por exemplo
"Let England Shake" (2011).
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Uma sonoridade estranha onde se vislumbram melodias bem identificáveis com a
voz de PJ Harvey, um álbum do qual se vai gostando progressivamente. Começa
com "Prayer at the Gate" e começa bem.
E para hoje aquele que considero com o melhor trabalho de 2023 de um
sobrevivente dos anos 60. Publicou o primeiro álbum em 1959 e o último é de
2023, 64 anos a separá-los, é obra!
Shirley Collins, actualmente com 88 anos (!!), figura ímpar e reverenciada do
Folk britânico, teve um papel primordial no revivalismo do Folk britânico nas
décadas de 60 e 70. Quer a solo, em duo com a irmã Dolly Collins (1933-1995),
com a The Albion Country Band, para citar algumas das suas colaborações,
Shirley Collins, apesar do longo retiro verificado desde os finais dos anos 70
até 2016, tornou-se uma referência obrigatória e influência maior de muitos
músicos consagrados do Folk-Rock.
Edição em CD da etiqueta Domino com a ref: WIGCD494
"Archangel Hill", o álbum de 2023 e o terceiro após o regresso, "Lodestar"
(2016) e "Heart′s Ease" (2020) são os outros dois, continua a revelar uma
vitalidade surpreendente e consegue mesmo integrar algumas das listas dos
melhores álbuns do ano, o que não é pouco para alguém da sua idade.
A faixa inicial é "Fare Thee Well, My Dearest Dear" e sobre ela escreve
a própria Shirley Collins:
"In 1904 in Monskgate, West Sussex, Ralph Vaughan Williams noted down this
exquisite and Poignant song from Mrs Harrier Verral, who, with her husband,
Peter, sang over one hundred songs to RVW and other collectors. It is one of
many narratives in which the female protagonist cuts her hair, dons male
attire and stows away on board ship, but is the only one I know that has
Venice as the proposed destination, and is liwise rare in rewarding such
entreprise with an unhappy ending."
Já no ano passado, em "Algumas memórias de 2022", o tinha referido e hoje fica
a confirmação. 2023 viu ser publicado um novo álbum, com novas canções,
de John Cale o que já não acontecia desde 2012.
John Cale já vai com 81 anos e continua a ser uma das figuras mais importantes
que o Rock nos deu e, infelizmente, não tão conhecido quanto devia. Figura de
vanguarda do Rock desde os anos 60 quando com apenas 21 anos resolve mudar-se
do País de Gales para os Estados Unidos onde conhece músicos como John Cage e
La Monte Young. Depois é o que se sabe, co-fundador com Lou Reed dos The Velvet Underground onde permaneceu de 1965 a 1968.
A partir daí carreira a solo partilhada com a de produtor e compositor de
bandas sonoras, gravou 19 álbuns de estúdio que nunca conheceram os Top e
nunca abandonou o seu carácter inovador o que conduziu a que alguns trabalhos
sejam ainda hoje de difícil audição (ouça-se por exemplo "The Academy in
Peril" (1972) ou "Church Of Anthrax" (1971)).
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"Mercy" é o álbum de 2023 do qual já se conheciam "Night Crawling" (ver
"Algumas memórias de 2022") e "Story of Blood" e encontra-se entre o que de melhor o ano de 2023 nos
deixou. Nem sempre de abordagem fácil, com necessidade de múltiplas
audições, é um disco bem recomendável e a rivalizar entre os melhores do
ano.
Tomei contacto com a música dos
Genesis
em 1972 quando foi publicado um dos melhores trabalhos de sempre do Rock
Progressivo de nome "Foxtrot". De seguida conheci o anterior "Nursery Crime"
(1971) e depois acompanhei de perto a discografia deste grupo até à saída do
grupo de
Peter Gabriel
em 1975. Em meu entender este é um dos casos em que a soma das partes é maior
que cada uma delas em separado. Ou seja as partes perderam com a separação.
Os
Genesis
foram progressivamente abandonando o Rock Progressivo e sob o comando de Phil
Collins abraçaram o Pop comercial que lhes granjeou popularidade e fortuna.
Quanto a
Peter Gabriel
teve um percurso errático, espaçado e nem sempre bem conseguido sob o ponto de
vista de composição e orquestração, que as qualidades vocais foram-se
mantendo.
Os
Genesis
terminaram em 2022 e
Peter Gabriel, actuamente com 73 anos, surge com um novo álbum de originais. "I/O", após
um interregno de 21 anos.
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E. se bem que bem recebido pela generalidade da crítica, não me consigo rever
nela, talvez por demasiado preso ao seu passado nos
Genesis, mas o que é certo é que não consegui deixar de sentir algum tédio à
medida que o fui ouvindo e não tive paciência para ouvir a 2ª mistura (na
realidade existem três misturas do álbum assim designadas: "Bright-Side
Mix", "Dark-Side Mix" e "In-Side Mix"). Talvez resulte ao vivo mas não
para ouvir em casa, não há pachorra.
Pois é, Iggy Pop tem 76 anos e disfarça-os bem. Quando em 1981 o vi ao vivo no
Pavilhão Infante Sagres no Porto, achei-o ultrapassado. Pese o Punk ainda
estar bem fresco e a música dele ter sido considerada percursora desse
movimento, pareceu-me musicalmente desinteressante, restando a sua postura
enérgica em palco. Talvez a má qualidade sonora que naqueles tempos os
concertos de Rock tinham (o Pavilhão Infante Sagres não tinha os mínimos)
tenha contribuído para o meu juízo, mas quão errado eu estava.
É certo que os seus discos da década de 80 não encantaram, mas é verdade que
sempre soube explorar caminhos não fáceis de percorrer do Rock Alternativo, do
Garage Rock ao Punk Rock.
Dentro do género mantem-se como uma figura de topo, revelando uma actualidade
e frescura invejáveis, é assim que em 2023 surge ""Every Loser" o seu mais
recente longa duração. Nem idade e a escoliose lombar por demais evidente
o inibe de continuar com actuações frenéticas a fazer inveja a muitos jovens.
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Bem recebido pela crítica "Every Loser" combina uma série de estilos que não
frusta as expectativas dos fãs. Ouça-se "Frenzy", a faixa de abertura, que é o primeiro destaque deste álbum a não
ignorar.
A solo Graham Nash publicou até à data somente 7 álbuns, dir-se-á que não é
muito para quem já vai na provecta idade de 81 anos. No entanto não esquecer a
sua discografia e respectivo contributo em grupos de que fez parte, The Hollies e Crosby, Stills and Nash (com e sem Young) e ainda em duo Crosby
& Nash.
Figura importante do melhor Folk-Rock americano, pese ser inglês, com evidente
destaque nos anos 70 onde se encontra o seu melhor álbum "Song For Beginners"
(1971).
Pois em 2023 publicou um álbum novo de nome "Now" o qual teve boa recepção por
parte da crítica. Bem escrito, bem tocado, bem cantado, mas com falta de
chama. Menos Folk-Rock, mais Pop-Rock demasiado mainstream para meu gosto.
Nele não se encontram temas como por exemplo os saudosos: "Military
Madness","I Used to Be a King", "Simple Man" ou "Chicago", por exemplo.
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Um disco bem melódico e nostálgico que penso ganha com múltiplas
audições, foi essa sensação quando cheguei ao fim e ouvi "When It Comes To
You".
Cat Stevens e a década de 70 são inseparáveis. Em particular os primeiros anos
da década onde se situam os melhores trabalhos de Cat Stevens. Ainda nesta
década converte-se ao Islão e assim se vão passar muitos anos até ao seu
regresso a meio dos anos 90 já não como Cat Stevens mas como Yusuf Islam ou
simplesmente Yusuf. Já mais recentemente recupera o seu nome inicial e passa a
assinar Yusuf/Cat Stevens.
É assim que surge no álbum de 2023, "King of a Land", um álbum de canções
infantis. A voz bem característica ainda está, quase sempre, lá, mas a magia
de composição que tanto nos cativou há mais de 50 anos já não se manifesta.
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Aqui e ali parece ouvir-se o antigo Cat Stevens, como por exemplo na faixa
título "King of a Land" que agora segue para audição.
Quando em 2018 Paul Simon publicou "In the Blue Light" fiquei convencido, que
ao regravar com individualidades do Jazz um conjunto de canções suas menos
conhecidas, que seria a sua última gravação de estúdio. Tinha na altura já 77
anos e começavam-se a denotar algumas falhas vocais que faziam sentir saudades
de outros tempos com outras capacidades.
No entanto eis que em 2023 somos surpreendidos por um novo álbum de originais,
"Seven Psalms", entendida como uma peça única constituída por 7 partes não
divididas.
Pese a boa recepção pela crítica. tenho para mim que "Seven Psalms" está muito
longe do seu melhor quer em composição quer em interpretação onde são
evidentes as actuais fragilidades vocais de Paul Simon.
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Para alguns é o derradeiro álbum de Paul Simon, comparando-o a "Blackstar" de
David Bowie e "You Want It Dark" de Leonard Cohen, mas já não digo nada, tudo
é possível. Para já é "The Lord" que fica para a respectiva audição.
Ainda nos grupos com origem nos anos 60 não podia deixar passar em branco The Rolling Stones. The Rolling Stones já fizeram 60 anos de longevidade, poucos
se podem orgulhar disso. E, embora nunca tenha sido fã do grupo, sempre
preferi The Beatles, é verdade que o seu contributo para a história do Rock é
bem significativa. mais não fosse pela discografia realizada nos anos 60 e
pela duração e actividade invejável que o grupo tem. Também assinalável é a
pouca variação que o grupo sofreu desde que se constitui há mais de 60 anos.
Actualmente reduzidos a trio desde que Charlie Watts faleceu (1941-2021),
mantem-se a dupla fundamental Mick Jagger/Keith Richards e ainda Ronnie Wood
desde 1975.
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Em 2023 The Rolling Stones publicaram um novo disco de originais,"Hackney
Diamonds", num retorno ao Blues-Rock donde provavelmente nunca deveriam ter
saído. Já o tinham feito com o álbum de versões "Blue & Lonesome" em 2016
e desta vez, tirando "Rolling Stone Blues" de Muddy Waters, um conjunto
de originais bem engendrados maioritariamente da dupla Jagger/Richards.
"Sweet Sounds Of Heaven" é um ponto alto do álbum contando para isso com a
colaboração de Lady Gaga e Stevie Wonder, uma canção, que noutros tempos teria
tido outra divulgação que agora não teve.
Parece que grupos com origem nos anos 60 estão completamente obsoletos e que
deviam ter há muito terminado, veja-se os exemplos de gravações em 2023 dos
Jethro Tull e Yes, por exemplo. Mas parece-me que tal aconteceu sobretudo em
grupos da área do Rock Progressivo, um género datado e talvez por isso mais
fácil de desiludir.
Para hoje escolhi um grupo do qual já não ouvia falar há muito tempo: Strawbs.
Os Strawbs são um grupo inglês formado ainda na primeira metade dos anos 60
que experimentou, sob o comando de Dave Cousins, actualmente com 78 anos e único elemento permanente do grupo, diferentes abordagens musicais, do Folk ao Rock Progressivo. Foi ele o responsável pela "descoberta" de Sandy Denny
tendo com ela gravado em 1967 o álbum "All Our Own Work", mas só
publicado em 1973.
O maior sucesso do grupo foi a canção "Part of the Union" que fazia parte do
álbum "Bursting at the Seams (1973), canção rapidamente adoptada pelos
sindicatos ingleses, em particular no refrão "You don't get me I'm part
of the Union". Para além dos álbuns já citados são também de lembrar "From the
Witchwood" (1971), "Grave New World" (1972) e "Hero and Heroine" (1974),
álbuns de fusão do Folk com o Rock Progressivo a que alguns designaram de Folk
Progressivo.
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"The Magic Of It All" é o último álbum dos Strawbs, provavelmente mesmo o último
pois despediram-se dos concertos em 2023 no Festival Fairport's Cropredy
Convention. E sem deslumbrar é um trabalho honesto e agradável de se ouvir,
com a reconhecível voz de David Cousins ainda a denotar boas capacidades tendo
em conta a idade e os problemas de saúde do mesmo.
Nutri pelo grupo inglês Yes, como talvez já o tenha dito, uma particular
preferência no início dos anos 70. Eram efectivamente criativos e muito
agradáveis de se ouvir, por um lado vanguardistas e por outro contrastando a
tão aprazível e melodiosa voz de Jon Anderson que ainda hoje o é.
Fizeram história e são um marco do Rock Progressivo os álbuns da primeira
metade da década de 70, com atenção especial para "The Yes Album" (1971) e
"Close to the Edge" (1972). Estão, no entanto, muito datados e não é o género
de música que se ouça todos os dias, pelo menos no meu caso.
Sucessivas alterações no grupo proporcionaram progressivos álbuns de menor
interesse e deixaram de ser um "sim" â boa música. Em 2023 arrastam-se com
apenas Steve Howe da formação clássica e tornaram-se entediantes ao
continuarem a gravar pretensos álbuns de Rock Progressivo.
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Embora alguns críticos tenham recebido bem "Mirror to the Sky" (2023), nem
muita, muita nostalgia por tempos passados conseguem que recomende este álbum
fora do tempo e xaroposo. Um disco muito pobre a não merecer qualquer estrela.
Há grupos que são um verdadeiro anacronismo. Os Jethro Tull são um exemplo.
Muito poucos grupos de Rock dos anos 60 e 70 souberam manter-se até à
actualidade a merecerem a devida reverência, a maior parte devia ter saído de
cena a seu devido tempo. No caso do Jethro Tull tal devia ter acontecido no
final dos anos 70 com a publicação de "Heavy Horses" um dos últimos álbuns do
grupo que ouvi na totalidade. A partir daí a imaginação e a qualidade
interpretativa foram diminuindo, a figura de Ian Anderson impôs-se por
completo e a sonoridade do grupo passou a ser totalmente previsível e nada
entusiasmante.
Talvez Ian Anderson deve-se ter seguido carreira a solo e experimentado outros
caminhos, talvez no Folk, em vez de manter um grupo que da formação original
só ele resta (ou talvez não, o que permitiu-me vê-los ao vivo em 2000 no
Coliseu do Porto). Uma coisa é certa, actualmente são uma pálida imagem do que
já foram. e aí está a comprová-lo "RökFlöte", o álbum de 2023.
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Acrescentando a evidente perda de voz de Ian Anderson, "RökFlöte" confirma o
desapontamento que já há muito vinha revelando. Um álbum para esquecer.
Neil Young, estrela maior do Rock, também marcou, o que já não é novidade, o
ano de 2023. Também ele, à semelhança de Joni Mitchell, Van Morrison, Roger Waters e Bob Dylan, andou à volta do seu passado. E foram várias as edições que
o provam, vejamos:
- Série ORS: "Official Release Series Discs 22, 23+, 24 & 25", caixa com a
reedição dos álbuns "Freedom" (1989), "Ragged Glory" (1990), "Weld" (1991) e
"Arc" (1991).
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- Série OBS (Official Bootleg Series)
OBS02: "High Flyin'" (1977)
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OBS06: "Somewhere Under the Rainbow" (1973)
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Não os ouvi, só espero que tenham melhor qualidade de som do que "Citizen Kane Jr.
Blues" (OBS05) editado em 2022.
Antes de passar ao que mais interessa referir ainda:
- Série SRS (Special Release Series): "Odeon Budokan", edição só em vinil
de gravações em Londres e Tóquio da turnê de 1976.
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E finalmente o que considero serem os mais importantes.
- Série SRS (Special Release Series):
Ainda na série SRS foi publicado "Chrome Dreams", conjunto de canções
compiladas de gravações efectuadas entre 1974 e 1976 e inicialmente pensadas
para serem editadas em 1977 e que entretanto foram integradas em diversos
álbuns. Uma excelente compilação de grandes canções que se continuam a ouvir
com todo o prazer. De uma década recheada de grandes trabalhos este teria sido
um dos melhores se tivesse então visto a luz do dia. Mas, nunca é tarde para
nos deleitarmos com mais esta obra de Neil Young.
Edição em CD com a ref: 93624869351
- Série ORS (Original Release Series):
ORS53: "Before + After", nas palavras do próprio Neil Young:
"Songs from my life, recently recorded, create a music montage with no
beginnings or endings."
Edição em CD com a ref: 93624849841
Como podem constar múltiplas oportunidades de se deliciarem com um dos
melhores e mais produtivos músicos que o Rock produziu.
Proponho-vos "My Heart" original do álbum "Sleeps with Angels" (1994), um
excelente e menos considerado álbum, agora revisto. É Neil Young em 2023.
Bob Dylan publicou em 2023 o seu 40º álbum de estúdio e também ele se dedicou
à revisão do seu trabalho passado. Do alto dos seus 82 anos Bob Dylan continua
a ser uma referência da melhor música popular actual, Recorde-se o excelente
"Rough and Rowdy Ways" (2020) e a turné de 2023 que o trouxe ao Porto e que
tive a oportunidade de ver.
O álbum de 2023 intitula-se "Shadow Kingdom", de acordo como o filme-concerto
"Shadow Kingdom: The Early Songs of Bob Dylan", e é composto por 13 canções
sendo o instrumental "Sierra's Theme" a única original.
Muitas das vezes, quando um artista começa a rever a sua discografia, é
sinónimo de falta de inspiração ou mesmo decadência. Não é o caso de Bob Dylan que faz de "Shadow Kingdom" um álbum sério, actual e que "quase"
poderia ter sido composto agora.
Edição em CD com a ref: 19658767492
Associado ao concerto de Bob Dylan, inserido no "World Wide Tour 2021-2024,
o ano de 2023 fica marcado por "Shadow Kingdom" uma excelente revisitação de alguns temas da sua obra,
alguns poucos conhecidos, e que fica entre o melhor do ano que agora nos
deixou.
Recupero "Watching the River Flow" (lado A de Single editado em 1971).
O último álbum de originais de Joni Mitchell,"Shine", data de 2007. Foi o fim
de uma carreira excepcional que a colocam no topo da música popular, poucos se
lhe comparam.
Em 2015 sofreu um aneurisma cerebral que levou a um longo e intenso processo
de recuperação, voltar a andar, a cantar e tocar, faculdades que tinha então
perdido.
A surpresa surgiu em 2022 quando surge a fechar o "Newport Folk
Festival" tendo por suporte Brandi Carlile e um grupo de amigos. Entretanto,
já em 2023, realiza o seu primeiro concerto em nome próprio, o que não
acontecia desde 2000. É da primeira aparição que é publicado em 2023 "Joni
Mitchell at Newport", um feito notável mas que "peca", compreensivelmente,
pela ajuda vocal de Brandi Carlile e do coro ao ultrapassar dificuldades de
Joni Mitchell, deixando frequentemente de ser a voz principal.
Mas o melhor estava para vir, e o melhor está no seu passado e nos arquivos
que Joni Mitchell tem vindo a editar. Em 2023 surge o 3º volume, um conjunto
de 5 CD intitulado "Joni Mitchell Archives – Vol. 3: The Asylum Years
(1972–1975)" e é o melhor dos três volumes até agora publicados.
Caixa de 5 CD da editora Rhino com a ref: R2 717547 / 603497834303
As composições estão assim agrupadas:
- Graham Nash David Crosby Session, December 13, 1971 - For The
Roses Demos, Late 1971 / Early 1972 - Live At Carnegie Hall, February
23, 1972 - Live At Carnegie Hall (Cont.), February 23, 1972 - For
The Roses Early Sessions, April 16-21, 1972 - Live At Royal Festival
Hall, May 5, 1972 - For The Roses Sessions, July-August 1972 - James
Bay Benefit Concert, April 15, 1973 - Court And Spark Demos, Summer
1973 - Wild Tales (Graham Nash) Session, August 25, 1973 - Tonight's
The Night (Neil Young) Session, August 26, 1973 - Court And Spark
Sessions, September-October, 1973 - Live At Dorothy Chandler Pavilion,
March 3, 1974 - Live At Dorothy Chandler Pavilion (Cont), March 3,
1974 - Live at New Victoria Theatre, April 22, 1974 - Live
At Wembley Stadium, September 14, 1974 - The Hissing Of Summer Lawns
Demos, 1975
- The Hissing Of Summer Lawns Sessions, 1975
Entre o que conheço a melhor caixa de arquivos do ano de 2023. Altamente
recomendado para todos os fãs de Joni Mitchell. Difícil é a escolha de uma
das 96 faixas que compõem esta caixa, não preciso de ir longe, fico logo
pelo primeiro CD. A faixa é "Electricity", canção ao vivo no Carnegie Hall,
em 23 de Fevereiro de 1972, e pertencia ao LP "For The Roses" do mesmo ano.
Roger Waters está já com 80 anos. Em 2023 deu continuidade à turnê "This Is
Not a Drill" que, apesar da controvérsia gerada pelas suas posições nos
conflitos russo-ucraniano e israelo-palestiniano, tem sido um sucesso e digno
de se ver.
O mesmo já não digo do seu mais recente álbum "The Dark Side of the Moon
Redux", revisão do álbum "The Dark Side of the Moon" de 1973 dos tempos idos
dos Pink Floyd. Hoje, consensualmente considerado um dos melhores trabalhos de
sempre do Rock Progressivo, não tem nesta versão a dimensão que merecia ter.
https://www.discogs.com/
Em 2022 apreciei o seu "The Lockdown Sessions" onde, em confinamento devido ao
COVID-!9 reinterpretou temas do seu passado a solo e com os Pink Floyd, no
entanto não tive as mesmas sensações com este "The Dark Side of the Moon
Redux". Demasiado "Spoken Words" e perda de convicção, parecendo por vezes que
se está a ouvir o canal de rádio "Smooth FM", sem a originalidade e eloquência
de 1973, era em meu entender, um trabalho que se dispensava.
O exemplo vai para a faixa "Great Gig in the Sky" e quão distante fica do
original, ou não?
2023 foi o ano em que alguns músicos bem conhecidos com origem nos anos 60
consideraram efectuar gravações em revisão do seu passado. De modo diferente,
uns revisitando a sua própria discografia ou, no caso de hoje, recuperando música
da sua infância e que, de alguma forma, o influenciou, falo de Van Morrison.
Van Morrison, actualmente com 78 anos, publicou no ano de 2023 três
álbuns continuando com uma actividade discográfica impressionante. Van Morrison, já o devo ter dito não sei quantas vezes, é um dos meus músicos
preferidos de sempre e dele tenho quase toda a sua extensa discografia. No
entanto, tenho de ser sincero, há já alguns anos que a genialidade de Van Morrison parece ter diminuído ou mesmo desaparecido, efctuando um conjunto de
gravações que nada acrescentam ao melhor a que estava habituado. Tenho que
recuar a "Three Chords & the Truth" (2019) para encontrar um álbum que
mereça múltiplas audições.
CD duplo com a ref: 4819141
São de 2023 os álbuns "Moving On Skiffle" (duplo CD) que, como nome indica se
ancora no Skiffle dando-nos a ouvir 34 canções bem interpretadas e agradáveis
de se ouvir e "Accentuate the Positive" 19 versões de canções em toada
Rock'n'Roll e que dificilmente se ouve 2ª vez, assim pensando não o
adquiri.
https://www.discogs.com/
Pelo meio ficou ainda um terceiro álbum bem original na discografia de Van Morrison pois é somente instrumental e que é constituído por 17 temas não
editados das décadas de 70, 80, 90 e 2000. Este álbum inaugura uma nova
editora do próprio, "Orangefield Records", que será vocacionada para a edição
dos arquivos de Van Morrison.
https://www.vanmorrison.com/
Deste trabalho sugiro "Beyond Words" o tema de abertura.