mundo da canção nº 6 de Maio de 1970
Arrumada a questão do VII Festival RTP da Canção, onde para além da reportagem e algumas "Notas e Contranotas" eram publicadas as letras das canções classificadas nos primeiros quatro lugares, o nº 6 da revista "mundo da canção" continuava na divulgação da nova música portuguesa que então por cá se desenvolvia. E claro a presença de José Afonso era praticamente garantida.
Na carreira discográfica de José Afonso existe um hiato de 4 anos (1964 a 1968) sem gravações. Corresponde ao período em que esteve em Moçambique e onde continuou a sua profissão de professor. Em 1967, quando regressa "Sofreu perseguições políticas e foi finalmente exonerado «por conveniência se serviço» em Out. 1967.", conforme "Enciclopédia da Música em Portugal no Século XX". Vê-se então obrigado a dar explicações e em pensar no retorno à actividade musical onde encontra dificuldades em arranjar editora face à perseguição de que era alvo. É na Arnaldo Trindade do Porto que consegue contrato e onde grava o trabalho de longa duração "Cantares do Andarilho" editado em finais de 1968. É o início também do maior empenhamento político na luta e denúncia do regime fascista então vigente.
É deste trabalho que saem canções que ficaram para sempre parte integrante do cancioneiro popular português, como por exemplo: "Natal dos Simples", "Balada do Sino", "Vejam Bem", "Canção de Embalar" ou ainda "Cantares do Andarilho".
"Cantares do Andarilho", poema do pintor António Quadros e música do próprio José Afonso, era a letra reproduzida neste nº 6 de Maio de 1970 da revista "mundo da canção" que agora recordo.
É de Urbano Tavares Rodrigues o texto inserido na contracapa do disco:
" A noite das lágrimas e da raiva. A madrugada das carícias e do sorriso. O dia claro da festa colectiva. Tudo isso se encontra na poesia cantada de José Afonso, cantada por José Afonso. A luminosa gargalhada do Povo, o seu suor de sangue, nas horas de esforço ingrato e de absurda expiação. O lirismo primaveril e feminino das bailias que não morreram. E o orvalho da esperança. E os ecos de um grande coro de fraternidade sonhada e assumida. José Afonso, trovador, é o mais puro veio de água que torna o presente em futuro, que à tradição arranca a chama do amanhã. No tumulto da contestação, ma marcha de mãos dadas, com flores entre os lábios, é ele a figura de proa, o arauto, o aedo, o humilde, o múltiplo, o doce, o soberbo cantador da revolta e da bonança. Singelo José Afonso do Algarve doirado, dos barcos de vela parda, do Alentejo infinito sem redenção, dos pinhais da melancolia, dos amores sem medida, do sabor de ser irmão... José Afonso é a primeira voz da massa que avança em lume de vaga, é a mais alta crista e a mais terna faúlha de luar na praia cólera da poesia, da balada nova."
Segue "Cantares do Andarilho".
José Afonso - Cantares do Andarilho
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