De alguns nomes da música feita em Portugal nos anos 60 retinha somente o nome e (ou) a lembrança da leitura de algum texto sobre os mesmos enquanto a sua música pura e simplesmente não conhecia ou, na piordas hipóteses, não me lembrava de todo. Por exemplo o Nuno Filipe, a Magdalena Pinto Basto ou até a Teresa Paula Brito, pelo que a curiosidade de os (re)descobrir era grande.
Pois bem, aqui estamos, mais uma vez, com o Nuno Filipe (1947-2002).
Nuno Filipe deixou-nos 4 discos (3 EP e 1 single) sempre com a colaboração nas letras da poetisa Maria Teresa Horta.
Em Outubro de 1970 a revista “mundo da canção” referia-se à dupla Nuno Filipe/Maria Teresa Horta assim:
“Nuno Filipe. Dentro da via de uma canção internacionalista e urbana (nas suas coordenadas melódicas, musicais e instrumentais). Embora envolvendo temáticas enraizadas. Como os poemas de Maria Teresa Horta – uma das mais válidas vozes da poesia de hoje.”
Em 1969 foi editado o muito bem conseguido 3º EP, do qual me recordava mal, e ao que parece alvo da censura então vigente.
O tema escolhido é o 2º de nome “Canção à maneira de saudade, conforme poema de El-Rei D. Diniz”. O tom “jazzístico” é dado pelo acompanhamento musical do conjunto Álamos e a própria Maria Teresa Horta participa na gravação com a leitura de pequenos versos. É dela o texto da contra-capa que se transcreve:
“O microfone à minha frente tinha ao centro um pequeno coração vermelho, saliente, brilhante… tentei concentrar nele a atenção enquanto procurava não me lembrar ainda das palavras que teria de dizer, de gravar, sobre um fundo esgarçado de «jazz»: mundo diferente e tenso numa espécie de raiva e de doçura de arrepiar os nervos; a enroscar-se na pele …
À minha frente o coração parece uma pequena jóia, mas os olhos escorregam para o papel onde as letras se destacam firmes e precisas a formarem os seus versos:
Ai minha dor minha amizade / notícias aqui desta cidade / Ai, Deus, e u é?
…
Onde estão novas, onde estão dias / rasgado naquilo que nos servia / Ai, Deus, e u é?
À minha frente o coração de metal cromado… mexo nos cabelos a aliviar o peso dos auscultadores e mais à vontade, agora que já gravei, ensaio um sorriso tranquilo. Oiço os meus poemas cantados: a voz rebelde e agressiva de Nuno Filipe e sùbitamente a minha: apenas um momento numa das canções a dar um toque de mulher e de corpo. E volto para o meu lugar, atrás do vidro grosso, debruçado sobre a sala, fascinada.
…
Ai meu amor, ai meu amigo / cantai bem alto o que vos digo / Ai, Deus, e u é?”
Nuno Filipe - Canção à Maneira da Saudade
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